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sábado, 16 de março de 2013

O CENTRO DA ALMA

 Marisa F. Bueloni
Cadeira no 32 - Patrono: Thales Castanho de Andrade

            Peço licença ao leitor, pois gostaria de tratar um pouco de espiritualidade. Das nossas vivências. Do acervo humano que cada um possui dentro de si. Das nossas aventuras pessoais e da grandeza que é viver.
            Penso num assunto fascinante. O centro da alma e a periferia da alma. As contradições vividas no dia-a-dia. Como é difícil lutar contra os fatores externos! Creio que o núcleo da nossa alma será sempre aquele que se inclina para o Criador. É ali, no cerne da nossa espiritualidade que Deus repousa.
            E quando não colocamos Deus no centro de tudo, nossa vida desanda. Entendo sempre que Deus deve estar em primeiro lugar. Quando o Espírito atua em nós, é maravilhoso! Tenho feito uma experiência mística fascinante: viver com pouco. Passar com o que tenho e comprar somente o necessário. Experimentar uma vida verdadeiramente franciscana.
            Busco uma espécie de "pobreza temporal" e também espiritual, pois é como melhor me adapto a este mundo. Nunca me deslumbrei com nada, nunca senti inveja dos ricos e famosos, nunca desejei mais do que tenho. Sempre me contentei com o que possuo e já enfrentei, como muitos de nós, fases difíceis na vida.
            Há alguns anos, passamos (meu marido ainda era vivo) nossos apertos, e foi nessa época que mais vi o Espírito agir em mim. Assaltou-me uma força colossal. Da aparente fragilidade brotava um vigor inesperado. Eu construíra a casa sobre a rocha. Veio o vento, veio a chuva e minha casa permaneceu de fé. Meu coração foi valente.
            Nos momentos mais duros, rezei com fervor. Nas noites mais fundas e dolorosas, peguei o meu terço. E era ali, no centro da minha alma, que as forças se juntavam. Podia reconhecer meu lugar no universo, no mundo contemporâneo onde tenho de circular, conviver, me relacionar e comer o meu pão diário.
            O bom Deus sempre me ouviu. Tenho de reconhecer o afeto d´Ele por mim. Mas não fiquei esperando nada cair do céu... Fiz a minha parte, não tive medo nem vergonha. Trabalhei, fora e dentro de casa. E isso não mata ninguém, só nos fortalece. Olho para trás, vejo o que passei, e me espanto por ter sido tão corajosa e tão forte. Sinto orgulho de mim.
            O centro da alma. Imagino que o leitor esperasse algo mais intimista. Algo a respeito da fé, da espiritualidade mais profunda. Do encontro com o divino. No meu caso, o espiritual se fundiu com o sofrimento do cotidiano, com a luta pela sobrevivência digna, o enfrentamento com o desconhecido - e o divino se revelou para mim.
            Não sei de onde tirei tanta energia e entendimento. Agora, viúva, sozinha (por opção), quieta no meu canto, e com a vida razoavelmente estável, sinto os eflúvios do Espírito à minha volta. Olho para trás e Ele me diz: “Você chegou. Você chegou até aqui. Você ainda esta de pé. Eu te ponho de pé todos os dias”.
            Do centro da minha alma vejo a chama divina agir em toda parte. Esta luz que age em nós, quando nos deixamos domar. "Solte os remos!", diz sempre padre Edvaldo. “Solte os remos!”, repito com ele. Deixemos Deus comandar o barco da nossa vida. Deixemos o Espírito agir e atuar em nós. A Providência Divina existe e comprovei isso com meus próprios olhos.
            Fico feliz quando encontro alguém em quem presencio esta clareza espiritual que anima e eleva! Sempre digo que andar nos santos caminhos não significa renunciar à alegria, ao amor, à felicidade, às coisas lindas da vida.
            A felicidade completa é uma utopia. No decorrer da existência, há perdas, doenças, luto, dor, sofrimento. Nada dura para sempre. Nós mesmos vamos envelhecendo e vem a decrepitude... Nada é fácil. Não existe uma fórmula mágica para a vida. Filhos não vêm com bula. Casamentos se desfazem.  As separações são sofridas. E é preciso aprender tudo. Uma aprendizagem que jamais termina, pois há novas lições todos os dias. Feliz de quem as aprende com a beleza bíblica da Sabedoria!
            Lá, no centro da minha alma, faço conjecturas. Inferências. Busco o discernimento necessário para algumas questões relevantes. O centro da minha alma está à espera. Algo grandioso deverá vir até nós, num momento fatal. E será belo, sobretudo para os que esperam em Deus.
            Os tempos são trepidantes. Vemos a glória do mundo e vemos sua decadência todos os dias.  Por vezes, somos pegos de surpresa. O santo padre renunciou e haverá um conclave para eleger um novo papa. No ar, rumores do fim dos tempos. Será?
            Que o centro de nossa alma nos traga o justo equilíbrio, a lucidez necessária para atravessarmos com serenidade o que possa vir à frente. Nada nos perturbe ou nos tire a paz, nada nos assuste, como dizia Santa Tereza d´Avila. Sabemos que “a paciência tudo alcança” e que nossa alma precisa desta bela lição de amor.

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