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segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Férias: tempo de leitura e reflexão*

 Acadêmica Myria Machado Botelho
Cadeira n° 24 - Patrona: Maria Cecília Machado Bonachella

           Milton Hatoum, escritor e cronista brasileiro, em sua inspirada crônica, Livros de verão e literatura de verdade ( 6ª feira/4/01/2013/ Caderno 2/Estadão),veio ao meu encontro na reflexão de nossos tempos, tão pobres e precários de  boas leituras, aquelas que ensinam a pensar com espírito crítico e levam o leitor a imaginar, sonhar, sobretudo elevar-se a patamares  mais elevados do espírito.
      Referindo-se à Feira do Livro, realizada há poucos meses em Guadalajara, em que um escritor espanhol, desolado, perguntava a uma mulher onde estavam os leitores, ela apontou para uma fila de leitores que queriam comprar a edição espanhola do best-seller Cinquenta tons de cinza. O cronista acentua que, provavelmente, os leitores dessas historinhas de sexo e violência não se aventuram a leituras mais profundas que mergulham na condição humana e psicológica, no jogo social e político, nas contradições e misérias do nosso tempo, menos ainda na linguagem em sua forma de narrativa. No Brasil, estas baboseiras são ainda mais graves, em virtude da enorme precariedade estrutural de nosso ensino público. Milhões de jovens se ressentem de uma formação educacional consistente.
            No meu tempo de estudante, aprendíamos com os mestres a valorizar o vernáculo e o conhecimento dos bons autores, tanto nacionais quanto estrangeiros, isto desde cedo. Castro Alves, o poeta predileto de meu primeiro professor de português, era decorado para apresentação de jograis, isto depois de preleções que estimulavam e criavam o interesse. A poesia não era a arte de uma imensa minoria, mas constituía um entretenimento saudável, e as redações, bem como o manejo correto do vernáculo, uma exigência nas provas de outras disciplinas, sem o qual as notas eram rebaixadas.
       Mais tarde, quando me aventurei na difícil arte da escrita, um professor de literatura, escritor autodidata, redator principal do Jornal de Piracicaba por muitos anos, apaixonado por literatura e excelente crítico literário, conduziu-me pelos caminhos da arte que considerava a mais espinhosa de todas.Após a leitura dos textos, passávamos  para a análise gramatical e sintática, desdobrando- os e descobrindo o porquê da excelência ou das falhas.Tenho comigo uma lista das 10 obras-primas imprescindíveis numa biblioteca  particular: Dom Casmurro (Machado de Assis), Vidas Secas (Graciliano Ramos), Grande Sertão, Veredas( Guimarães Rosa), Guerra e Paz (L. Tolstoi), A Cartuxa de Parma ou O Vermelho e o  Negro (Stendhal ), Crime e Castigo (F. Dostoievski), O velho e o Mar (E. Hemingway), Ilusões Perdidas (H. de Balzac),Lord Jim (J.  Conrad ).
            Nestas férias, num lugar de paraíso, no alto da Serra de S.Pedro, descansei com a releitura ( hábito freqüente) de meu autor preferido na infância, Monteiro Lobato. Desta vez, deliciei – me com  A história do mundo para crianças. Transportei-me para aquele mundo encantado, aquela forma sutil e maravilhosa de ensinar, conduzindo e trabalhando a imaginação e a curiosidade através do conhecimento. Sua obra é imortal.
            Repetindo o grande cronista, mencionado no início, Lobato permanece, após quase um século, enquanto o tempo se incumbe de apagar os tons de cinza, os crepúsculos, as cabanas e a xaropada que finge literatura para ressaltar ainda mais o valor dos grandes imortais.

* Texto publicado na GAZETA DE PIRACICABA

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