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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A RENÚNCIA DO GRANDE DEFENSOR DA FÉ

 Acadêmica Myria Machado Botelho
Cadeira n° 24 - Patrona: Maria Cecília Machado Bonachella


            Coragem, humildade, defesa intransigente de princípios morais inegociáveis, sobretudo maturidade de fé, escudada em grande sabedoria teológica e conhecimento da doutrina cristã, eis o legado do papa Bento XVI que anunciou sua renúncia no último dia 11 de fevereiro, num gesto grave e histórico.
            Vários são os motivos alegados e explorados pela mídia sensacionalista, embora se saiba que o feitio deste papa não seja o dos impactos e das exposições espetaculares. Simples, modesto e discreto, o verdadeiro servo de Deus na acepção da palavra, seu gesto, pensado e refletido é sim o da decisão lúcida e coerente de um homem vergastado pelo peso de uma responsabilidade maior do que sua capacidade humana pôde suportar.
          Não somente a saúde fragilizada, mas principalmente o reconhecimento de que as rápidas mudanças e agitações de grande relevância para a vida da fé, numa conjuntura de graves divisões e crises movidas por interesses políticos, pessoais e ideológicos, incompatíveis com a doutrina cristã, estão desfigurando os pilares eclesiásticos. Sabe-se que, nas diversas tentativas e reações extremas contra o governo paralelo que teria se formado à sua sombra sob o comando de um cardeal italiano, o papa sentiu a exaustão e o isolamento político, consciente de que já não mandava sozinho na Santa Sé. Com os poucos anos que lhe restam, convenceu-se de que não conseguiria fazer o que havia planejado em face da resistência de seus ex-aliados; achou por bem abandonar o confronto num momento de relativa calmaria.
            Na Quarta – feira de Cinzas, em sua última Missa realizada na Basílica de São Pedro, o papa deixou entrever em sua homilia, esta problemática, apoiado no Evangelho
que condena a hipocrisia dos fariseus.
            A Igreja, fundada por Jesus Cristo, é santa; porém ela é formada por santos e pecadores.A dor e a emoção que sacudiram milhões de cristãos nesses momentos incertos, vêm acompanhadas porém, de uma certeza:A “Barca de Pedro” não soçobra; permanecerá firme, apesar dos ventos e das tempestades! As portas do inferno não prevalecerão sobre ela, sustentada por Jesus, o Supremo Pastor, cuja Palavra de salvação permanece para sempre, no mundo de ontem, de hoje e de amanhã. Firme porque para conduzi-la, temos a força e a santidade de grandes condutores, zeladores e defensores da fé, a legar para a posteridade o testemunho de sua edificação.
            Sucessor de João Paulo II, o papa carismático, de quem foi grande amigo e conselheiro por mais de 15 anos, Bento XVI não possui seu carisma, embora tenha sido, provavelmente, o intelectual mais preparado para a cátedra de Pedro. Autor de escritos  e encíclicas notáveis,  de enorme profundidade, como Caritas in Veritate ( A caridade na Verdade), Deus Caritas Est ( Deus é Caridade), suas páginas repletas de reflexão estruturadas num imenso amor ao Deus da Verdade, de quem tudo provém, conduzem-nos para uma espiritualidade construída e amadurecida pela razão. Uma luminosa sabedoria, apoiada na vasta formação teológica e clássica, desdobrando-se no raciocínio lúcido  sobre os aspectos da verdade e da caridade de Deus, ambas em estreita ligação.
Na encíclica Spe Salvi (Salvos na esperança), em refinada abordagem, a mensagem de Cristo é desvinculada da política; citando Kant, Platão, Dostoievski, Nietzsche e Marx, o grande teólogo discute os limites da modernidade e da construção de um mundo sem Deus e sem a esperança que encoraja a razão e dá-lhe a força para orientar a vontade.
          Toda essa herança, nesses oito anos de pontificado, será lembrada por milhares de cristãos que desfrutaram de seus escritos, de suas aulas catequéticas e de seus sábios pronunciamentos. Bento XVI nos deixa um precioso legado e um forte testemunho de autenticidade. Este papa será lembrado sempre como um grande defensor da fé num mundo dividido por tantas e alarmantes problemáticas. Como Cristo, crucificado pela incompreensão e a injustiça, seu testemunho da Verdade, única e intransigente, é o sinal característico da contradição, a marca do verdadeiro cristão, proclamada e vivenciada por Cristo, há mais de dois mil anos. 

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