Ivana Maria França de Negri
Era ela e o gato. Ninguém mais. Os dois
se entendiam numa simbiose perfeita.
Pela manhã, enquanto fervia a água para
o café, a moça colocava o leite no pires do gato. E ambos sorviam com gosto
suas bebidas prediletas. Ela, o café fumegante e amargo, e ele, o leite morno e
adocicado.
A mulher era escritora. Nos dias em que
vinha alguma inspiração, não parava de digitar e seus dedos dedilhavam
freneticamente as teclas do computador. Ficava por horas, às vezes dias, ali, como
que hipnotizada, presa ao texto, entranhada nele. E o gato sabia, por pura
intuição, que nesses momentos era melhor silenciar. Ficava num estado de
semi-dormência na almofada da poltrona azul, ao lado da sua dona. Nada de pedir
que ela suprisse suas carências e dengos.
A
sintonia entre os dois seres diferentes era tanta que um sabia o que o outro
necessitava, se silêncio e sossego, ou algazarra e explosão de alegrias.
Ao longo de vários anos de convivência, ele
aprendeu a compreendê-la e respeitava seus surtos de inspiração. Nesses
momentos nem solicitava sua atenção. Sabia que quando a obra estivesse
terminada, ela voltaria à normalidade, brincaria, faria afagos em sua barriga e
conversariam como sempre faziam. Falaria palavras carinhosas e ele responderia
com miados breves ou longos, conforme pedisse a situação.
Naquele relacionamento único, não cabiam
mais pessoas ou bichos. Os dois se bastavam.
Bicho/gente, gente/bicho, em sintonia
perfeita, dois seres diferentes, mas de um mesmo Criador.
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