Marisa Bueloni
Todos nós temos um Natal que foi um sonho em nossas vidas. Havia um gosto de Natal dentro do coração, na mangueira do quintal, no amor dos meus tios cujas casas eram no mesmo quarteirão que a nossa, nas árvores das ruas, na lua branca, na harpa de Luis Bourdon tocando no rádio, na janela do meu quarto por onde se viam os pés de frutas do vizinho – lá, onde todo balão caía, toda maçã nascia – , e a dona do quintal nem via. Creio que na nossa tenra meninice, o dia de Natal era o mais esperado de todos os dias. Ah, Natal querido, Natal singelo e simples, do presente prometido pelos pais amados, o coração pulando de alegria pela boneca, pela casinha, pelo brinquedo, o vestido pedido o ano inteiro, com o qual se ia à missa de Natal. Uma sandália encantada, um sapato de Cinderela, uma caixa de lápis de cor, daquelas bem grandes, que amávamos e usávamos até que a última cor se apagasse na folha branca da nossa felicidade. Ali, no terraço sombreado, colorido pelas florzinhas rosas, um grupo de primos da minha idade, vestidos com roupas novas, se reunia para jogar e passávamos horas, debruçados sobre o monte de palitos coloridos, cada um jogando a sua vez, tentando tirar um por um, sem mexer, sem derrubar a formação inicial. Era uma festa que não tinha fim. Nós éramos os donos do tempo e a vida tinha a cor daquelas varetas preciosas.
Ah, Natal do Menino Jesus! Natal dos presépios. Natal dos anjos, dos pastores e das ovelhinhas, dos reis magos montados em seus camelos, seguindo a estrela de Belém. Nós sabíamos que era Natal, por causa do Menino Jesus. Nós só poderíamos entender aquele espírito de fé, porque víamos nossos pais falando com amor do nascimento do Menino. Havia as novenas, os terços, as celebrações que antecediam a festa máxima da cristandade, e minha mãe ficava com os olhos cheios d´água quando dizia: “Estamos entrando na semana do Natal”.
Mas hoje, onde está o Menino Jesus? Se perguntarmos a uma criança o que é o Natal, é provável que nos responda: “É a festa do Papai Noel, é o dia de ganhar presentes”. Nas últimas décadas, notamos que toda a propaganda natalina tem girado em torno do consumo, do materialismo desregrado, sem uma única referência ao verdadeiro sentido desta celebração. O grande Aniversariante é esquecido. Em muitos cartões de mensagens, já não há nenhuma referência ao natalício de Jesus. Li que na Europa estão abolindo os dizeres de "Feliz Natal", para não constranger os de outras confissões religiosas. Escrevem-se apenas "Boas Festas" ou "Feliz Ano Novo" – nada sobre o Natal, nada sobre Jesus Cristo. Jesus se tornou um nome quase proibido. E assim, sem nenhuma referência ao Menino, a mídia contribui para que a fé católica do povo brasileiro esfrie cada vez mais. As crianças crescem sem o conhecimento do verdadeiro significado do Natal. Em breve, apenas um pequeno resto saberá quem é Jesus e, cada vez mais, o Natal será o dia de Papai Noel, uma festa como outra qualquer, onde se come, se bebe e se presenteia, não se sabe por quê.
Em algum Natal de sonho de nossas vidas, a beleza do presépio ainda está viva na memória do tempo, trazendo amor e paz à nossa alma pequenina. Um Natal de sonho será aquele que guardamos intacto em nosso coração.