Andre Bueno Oliveira (cadeira no 14) e Myria Machado Botelho (cadeira no 24) |
Tanto quanto sua Herança de Poeta, sua visita, Andre Bueno Oliveira, comoveu-me pela simplicidade, junto de uma aquisição, a de ganhar um amigo. Porque é na amizade que nossos ideais e nossas esperanças nascem e são divididos em silêncio. É na amizade que amadurecemos o espírito e partilhamos o prazer das descobertas. Estas, embora muitas vezes não constituam surpresa, podem ser surpreendentes, como a de seu primeiro livro que você, muito modestamente, concedeu-me o privilégio de colocá-lo em minhas mãos.
Eu não o conhecia pessoalmente, a não ser pelas antologias enriquecidas por sua participação nas páginas literárias dos jornais da terra e de nossas bravas incentivadoras da arte em Piracicaba e também poetas: Maria Cecília Machado Bonachella (sua amiga e admiradora enquanto viveu) e Ivana Maria F. de Negri.
André, tudo o que se escreveu e falou sobre seu livro é de inteira justiça, ao qual eu acrescentaria que sua herança não se restringe à família. Ela é também um patrimônio, um enorme benefício para as letras piracicabanas, além de constituir uma vitória da persistência. Sim, porque não é fácil resistir a essa onda de modismos, inovações e hermetismos que vem transformando nossas preciosas letras em produtos descartáveis e medíocres, com raríssimas exceções, é claro. Seus versos rimados, com certeza mais difíceis, contêm aquela sonhada simbiose de forma, conteúdo, musicalidade, sobretudo simplicidade, aquela faculdade de dificílima execução, tão sonhada pelos escritores verdadeiros, como bem a descreveu nosso grande mestre Machado.
Ao acaso, lendo seus versos, os sonetos por excelência, talvez o mais exigente para o poeta, vamos colhendo pérolas de lavor delicado pérolas que para serem citadas não caberiam no curto espaço de uma crônica. São tantos os que falam ao coração e à sensibilidade, além de surpreendente “facilidade” de seus malabarismos que bem demonstram uma escola, aquela que não se improvisa, nem surge espontaneamente da noite para o dia. Ela requer muito traquejo, estudo, vigília e arte. Ao lado, pé claro, do necessário talento. O poeta é, não se faz. Um soneto sem verbos, outro com rimas proparoxítonas, outro ainda monissilábico em versos, realmente é proeza para poucos.
Entre tantas filigranas de seu livro, o seu Soneto Livre, retrata bem uma trajetória de poeta que alcançou, a duras penas, uma realização exigente e bem formada nos caminhos da verdadeira poesia:
“Trilhando da poesia o labirinto,
entrei mas catacumbas dos sonetos.
Caí nas rimas duplas dos quartetos,
sem antes explorar o seu recinto.
A queda me feriu, mas dor não sinto.
Levanto-me. Procuro os mais diletos
caminhos generosos dos tercetos,
e sigo a cada passo o meu instinto.
Às vezes sigo a regra lusitana,
levando de Camões a seriedade.
Porém, ao ler os versos de Quintana,
e de outros menestréis (Drummond de Andrade),
percebo que o soneto se engalana,
buscando da prisão, a liberdade!”
Parabéns, meu novo amigo: seus versos, como as asas diáfanas da fantasia, acariciam o coração e a alma, e despertam o sentimento para as boas coisas da ávida, hoje mais necessárias do que nunca. Obrigada duplamente pela sua homenagem póstuma a nossa querida Cecília, que lá no céu estará compondo um agradecimento para você com aquela candura toda sua, “em versos que consolam qualquer pranto”.
* texto publicado no Jornal de Piracicaba (dia 3 de junho de 2011)
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