Arte de Marcus Penna |
Ivana Maria França de Negri
Neste dia dos professores, eu poderia
homenagear dezenas deles. Os que foram meus mestres maravilhosos e deixaram
marcas indeléveis. Os que foram professores dos meus filhos e lhes ensinaram
lições além do currículo escolar, para a
vida toda. Os professores tão queridos
das minhas netas. E também minha mãe, que foi professora, minha sogra, que se aposentou como professora
e está prestes a completar 105 anos de vida. Todos merecem homenagens, carinho
e gratidão.
Mas a professora que vou homenagear, nem
conheci pessoalmente. Uma anônima funcionária da creche de uma cidadezinha da
qual eu nunca tinha ouvido falar até então: Janaúba, em Minas Gerais. Seu nome:
Heley de Abreu Batista, 43 anos, casada,
três filhos. E o que ela fez de tão extraordinário? Simplesmente deu a própria
vida para salvar seus pequenos alunos.
Um insano, que trabalhava de vigia na
própria escola, chegou carregando um balde com álcool, e na mente doentia, o
plano já premeditado para consumar o ato demoníaco. Trancou todas as portas e
começou a jogar o combustível nas crianças e incendiá-las. A professora, mesmo
franzina, reuniu forças para entrar em luta corporal com o demente para salvar
suas crianças. Incansável, com o corpo
em chamas, não pensou nela, só queria livrar as crianças das labaredas e foi
retirando, por uma janela, quantas pôde até que suas forças foram minando.
Segundo funcionários, ela ia e voltava, em seu desespero para salvar todas e ao
mesmo tempo conter o louco que insistia em incendiar tudo. Por fim, sucumbiu,
com o corpo queimado em quase sua totalidade.
Sua mãe, à porta do hospital, em
lágrimas, dizia que ela foi o anjo das crianças e que Deus iria salvá-la. Mas
ninguém compreende os desígnios do alto e ela partiu com nove das suas
crianças, cujos corpinhos também não aguentaram as queimaduras e acabaram
falecendo.
Foram nove crianças mortas, mais a
professora e o assassino. Os pequenos mártires de quatro e cinco aninhos, que
tinham uma vida toda pela frente. A tragédia só não foi muito maior pela
atuação dessa heroína.
No velório, uma amiga de Heley contava
que desde criança ela gostava de brincar de escolinha e ser a professora. O
marido, inconsolável, disse que a esposa deve ter agido por instinto materno,
pois amava as crianças como se fossem seus filhos. Era muito querida, alegre e
sorridente, mesmo tendo passado por duros golpes na vida, como a perda do filho
mais velho, afogado numa piscina aos 4 anos.
Em tempos de idolatria a tantos ídolos
falsos, jogadores de futebol, artistas, políticos, essa moça sim, deve ser admirada
e lembrada como heroína.
Essa tragédia aconteceu perto do dia das
crianças e dos professores. E deixa uma lição. Apesar de tanta gente de má
índole, que rouba, mata, engana, estupra, ainda existem pessoas maravilhosas,
verdadeiros anjos de luz, que dão a vida por outras vidas, e por causa dessas benditas
almas iluminadas, a humanidade ainda deve manter esperanças. Nem tudo está
perdido, pois tenho certeza de que no Brasil existem milhares de Heleys
anônimas que, mesmo com o salário minguado de professor, fazem da profissão uma
missão sagrada com muito altruísmo e dedicação.
Esteja em paz, professora guerreira,
amorosa, iluminada, heroína da pequena Janaúba e exemplo para todo o Brasil.
*Texto publicado na Gazeta de Piracicaba 14/10/2017
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