em 15/01/2012
André Bueno Oliveira fala sobre sua vida, experiências profissionais, contato com a arte, política e casamento homossexual em entrevista a João Umberto Nassif
Foto: João Nassif - André Bueno Oliveira e sua última obra lançada |
Juiz de paz, escritor, poeta, músico e contabilista. André Bueno Oliveira é imortal da Academia Piracicabana de Letras. Lançou recentemente sua obra “Herança de Poeta”. Realizou 12 coletâneas espontâneas, 11 coletâneas por vitórias em Concursos Literários, Premiações e Menções Honrosas em Piracicaba, Tatuí, São da Boa Vista, Cerquilho, Itapetininga, e outros estados como Paraná, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. A partir de 1988 começou a publicar seus poemas nos jornais A Tribuna Piracicabana e Jornal de Piracicaba. André atuou por décadas como contabilista na empresa Mausa. Pode-se afirmar que é um intelectual de números e letras. Após aposentar-se, assumiu a carreira de juiz de paz. Nasceu no dia 8 de julho de 1945, em Laranjal Paulista, popularmente conhecido como Capela de São Sebastião, à margem direita do Rio Tietê. Filho primogênito dos cinco filhos do casal Adriano Bueno de Almeida e Ana Oliveira de Almeida, quando André tinha três meses de idade sua família mudou-se para Piracicaba. Seu pai passou a trabalhar como serventuário na Escola Senai, na rua Dr. Otávio Teixeira Mendes, próximo ao atual Terminal Urbano.
A família do senhor mudou-se em que ano para Piracicaba?
Foi no final de 1945, mudamos para a Avenida Madre Maria Teodoro, esquina com a rua Maria Nazareth, abrangendo a área onde hoje se situa a Papelaria Takaki. Essa área pertencia ao meu avô materno João Francisco de Oliveira. De lá mudamos para a rua Fernando Souza Costa, a cinqüenta metros da Rua Marquês de Monte Alegre. Em seguida mudamos para a rua São João, quase esquina com a rua Dom Pedro I, na Vila Furlan. Era uma vila contendo seis casas, três de cada lado. Essas casas existem até hoje.
As primeiras letras o senhor aprendeu em que escola?
Foi no Sud Mennucci. Minha primeira professora, Dona Hilda, exerceu grande influência na minha atividade literária, não sei por qual razão, mas ela decidiu que eu tinha muita aptidão para recitar poemas. Para a comemoração da Proclamação da República ela deu-me um poema para declamar no pátio da escola, envolvendo alunos de outras classes da escola.
Após a mudança de local de residência onde o senhor passou a estudar?
Do segundo ao quarto ano primário estudei no Grupo Escolar Doutor João Conceição, ao lado da Igreja dos Frades. No segundo e terceiro ano tive aulas com Dona Alzira Petz Prado, ela também me incentivou para a atividade poética. Eu não fazia isso por gosto e, sim, por obrigação, sempre tive capacidade para decorar os poemas. Dona Alzira me deu um poema chamado “O Casamento do Pato”, uma história engraçada, com um dialogo bem caipira.
Após concluir o curso primário aonde o senhor continuou seu estudo?
Fui para o Seminário São Fidelis, meu pai sempre foi muito religioso, era Mariano, por muito tempo ele trabalhou na Igreja São José, no conceito dele, o ofício de padre era uma atividade muito importante. Fui para o seminário com 11 anos, é difícil haver vocação nessa idade, isso para qualquer profissão. Os quatro anos de ginásio eu estudei como interno no Seminário Seráfico São Fidelis. Fui para Mococa para estudar o Clássico, voltado para Ciências Humanas.
No período em que o senhor permaneceu como interno no Seminário Seráfico São Fidelis, a sua família residia também em Piracicaba. O fato de estar interno e ter a família na mesma cidade provocava alguma nostalgia?
Eu não senti isso no período em que estive interno, a nossa família era de origem muito pobre. No seminário, encontrei dois ou três campos de futebol, jogava como ponta direita, tinha basquete, campo de tênis, piscina, os passeios mensais. Em média havia uma centena de alunos, divididos por turmas, conforme a faixa etária. Lá aprendi latim, grego, um ano de italiano, francês, inglês.
O senhor ajudou a celebrar muitas missas, lembra-se da introdução?
“Introibo ad altare Dei, ad Deum qui laetificat juventutem meam!” (tradução - Subo ao altar de Deus, o Deus que alegra minha juventude). Usei o turíbulo, na época era uma diversão poder usa-lo nas cerimônias, era uma honra, havia disputa entre os coroinhas para poder utilizá-lo.
O senhor concluiu o clássico em Mococa?
Quando passei para o terceiro ano do curso clássico, saí de Mococa. Eu deveria ser removido para realizar o terceiro ano clássico em Nova Veneza, nesse intervalo acabei mudando de idéia. Fiz seis meses do terceiro ano clássico no Sud Mennucci. Só que pelo fato de ser o filho mais velho, tinha que ajudar a compor a renda familiar.
Onde foi o primeiro trabalho do senhor?
Foi no Cartório de Notas do Mozart Aguiar, ao lado do Cine Politeama. Meu serviço era datilografar escrituras. Entrava às cinco horas da tarde, pegava os livros onde eram redigidos os documentos e os transcrevia para as cópias. Éramos dois, mantínhamos em ordem, no máximo às sete horas da noite estávamos indo embora. Só que eu necessitava arrumar um emprego em período integral, onde pudesse ter um salário melhor. Entrei na Mescli, Metalúrgica Santa Cruz Ltda. O proprietário majoritário era o Danelon. Permaneci na empresa até o período em que ela entrou em declínio. Minha atividade era a de auxiliar de custos. Em setembro de 1963 entrei para a Mausa. Em 1964 fiz o Tiro de Guerra.
O senhor estudou contabilidade?
Quando entrei na Mausa, fiz a migração do curso clássico para o técnico de contabilidade. Sem perder o que já havia estudado. Não consegui, tive que fazer o Curso Técnico de Contabilidade desde o início no Instituto Piracicabano. Fui aluno de Henrique Cocenza e Barjas Negri.
Como era o Professor Barjas Negri?
Bem exigente. O Cocenza era descontraído, como sempre foi.
O cipoal de leis instituídas pelo governo sempre existiu?
Sempre. Não tínhamos os recursos de informações existentes hoje, nossos recursos eram em primeiro plano o Diário Oficial, a parte fiscal da nossa empresa era muito bem organizada, tínhamos contadores na área fiscal, na contabilidade geral, recursos humanos. Tínhamos que ter tempo para ler o Diário Oficial, tanto do Estado como da Federação, assim como as revistas da época: IOB, Mapa Fiscal.
Como o senhor vê essa diversidade de leis?
Acredito que isso atrapalhe o desenvolvimento do país.
Essa profusão de leis existe por diletantismo de quem as elabora ou por interesses nem sempre muito claros?
Acredito que seja por interesses não muito claros. Tem muito legislador que nem sabe o que ele está aprovando, mas está aprovando algo que irá beneficiar alguém.
É onde entram os famosos lobistas pessoas com boa articulação que promovem facilidades usando conhecimentos pessoais e obtendo lucro pessoal com isso.
Exatamente. Quem manda no país de verdade? Quem sabe dizer com exatidão quem manda? São os legisladores? Os deputados federais? Estaduais? Ministros? Eu acredito que quem manda mais é aquele que faz o país produzir.
Como é explicar á um estrangeiro o funcionamento da nossa legislação?
Nem tem como explicar. Ouvimos dizer que em outros países as coisas são mais simplificadas, só não temos como afirmar o quanto é simplificada a legislação de determinada nação. Que a nossa é complexa demais, não resta a menor dúvida. Até para especialistas em leis, como era o nosso caso, percebia-se que havia muita coisa, e diversas delas desnecessárias.
O Brasil era tido como o “país do futuro” parece que o futuro chegou, as empresas estrangeiras estão voltando seu olhar para o Brasil. Só que o choque delas com relação ás leis é muito forte.
Por isso são criados incentivos momentâneos para as empresas que vem de fora. Depois que ele aceitar e se instalar, decorrido o tempo determinado pelo incentivo ele terá que se enquadrar na burocracia do país. Irão ter que se adequar a realidades que não estão acostumados a viver em outro país. Muitas vezes tínhamos que resolver problemas que não estavam dentro da nossa esfera de decisão consultávamos as fontes seja estadual, federal. Muitas vezes, os próprios fiscais diziam que aprendiam conosco, pois levávamos problemas que eles nunca tinham visto na literatura fiscal.
Como o senhor passou a ser juiz de paz?
Em 1995 eu me aposentei e o José Flavio, do Primeiro Cartório de Registro Civil, ficou sabendo que eu estava aposentado e me convidou.
Para ser proprietário de cartório o que é necessário?
Antigamente cartório era hereditário. Hoje já não é mais. Quando o oficial do cartório se aposenta, o cartório vai a concurso público. O cartório de registro civil basicamente faz o registro de nascimento, casamento e falecimento. Faz também reconhecimento de firma.
O senhor se lembra quando oficializou o primeiro casamento? E a primeira diligência?
Em ambas as situações eu levei o texto escrito. Geralmente o cartório agenda os casamentos para sexta feira e sábado.
Em que mês se casa mais?
Em dezembro.
O mês de maio não é o mês das noivas?
Já foi. A quantidade maior de casamento sempre foi em dezembro, isso porque é verão, tem décimo terceiro salário, férias, se quiser fazer a lua de mel em uma praia irá ter certeza de que não vai passar frio.
Estamos sendo iludidos há muito tempo, quando a mídia diz que maio é o mês das noivas?
Não acredito que seja ilusão intencional, mas sim falta de conhecimento de causa para passar essa informação.
Em grandes centros há o casamento civil e o cerimonial que deveria ser feito em uma igreja por um religioso, é feito por um amigo do casal, geralmente um bom orador. É um casamento sem nenhuma validade sacra.
Há um bom número de casamentos realizados apenas no civil, principalmente por haver algum impedimento religioso para a união do casal. Hoje é muito comum o Juiz de Paz realizar diligências, que é oficializar o casamento em locais pré-determinados, como chácaras por exemplo. O casamento religioso é feito apenas por aquele que tem autoridade religiosa.
O senhor já realizou casamentos entre pessoas do mesmo sexo?
O que chegou até agora ao meu conhecimento é que a legislação determina direitos civis equivalentes a ambos, legalmente. Até o presente momento no nosso cartório ninguém nos procurou. Se a lei determinar que seja válido o ato de realizar o casamento de pessoas do mesmo sexo, somos obrigados a realizá-lo.
É costume, ao casar a mulher agregar o nome do marido, é possível o marido agregar o nome da esposa?
O homem pode incorporar o sobrenome da esposa ao seu nome. Isso já aconteceu no cartório diversas vezes. Pessoalmente não considero isso prático, pois a pessoa terá que alterar seu nome em todos os documentos, inclusive no certificado de reservista. O fundamento dessa atitude em assumir o nome da esposa e vice-versa é tido romanticamente como uma reciprocidade de carinhos.
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