Elda Nympha Cobra Silveira Cadeira n° 21 - Patrono: José Ferraz de Almeida Junior |
As horas
tardias, em decrescência, foram transmutando a cor do aposento, antes moldado
pela penumbra da noite. A luz solar, coada nas tramas da cortina de voile
transparente, foi transformando o ambiente em lindo dia de sol e insolente foi
despertando a linda jovem ainda insone que, abrindo os olhos sonolentos contra
a claridade, sorriu. Um sentimento de felicidade invadiu sua alma ao constatar
que esse seria mais um dia pleno, na somatória de sua vida, pois ao receber de
Deus o presente do sol, ganhou de brinde um friozinho para se aconchegar nas
cobertas de lã de carneiro, nos lençóis perfumados de lavanda e uma mesa farta
de iguarias à sua espera. O cheirinho de café coado impregnou suas narinas e
aguçou seu paladar. Tudo lhe vinha de graça sem esforço nenhum, como dádivas
merecidas, mas na verdade, porque merecidas? Saindo das cobertas, e tomando seu
lauto café da manhã começou a pensar: -- O que farei de útil nessa minha vida
que passa insípida e sem valor para ninguém, pois sou como água desperdiçada
escoando de uma jarra de cristal? Estou me sentindo inútil! Esse viver foi-me
dado por alguma razão!
Que
diferença entre o viver dela e o viver de outras moças, que fazem da rua sua
moradia, negociando seus corpos, outras ou outros usando jornais como cobertor
para enfrentarem o frio, que vai enregelando, não só seus membros, mas também
suas almas. São muito diferentes dela, que não espera nem um minuto para saciar
a fome, estar agasalhada e nem espera para receber amor. Tudo vem de graça, sem
esforço nenhum, como presentes divinos.
-- Meu
Deus! Por que as pessoas têm vidas tão diferentes? O que teria acontecido para
seguirem por caminhos tão diversos? Por que uns já nascem com privilégios e
recebem dos familiares carinho, afeto e amor, enquanto outros nascem para
sofrer?
Ela
começou a chorar, e uma serviçal querendo consolá-la foi dizendo:
-- Todos
têm que evoluir na escala espiritual: uns estão permeando “caminhos nunca
dantes navegados”, outros, pelos seus merecimentos, já galgaram uma posição
espiritual melhor e têm outros tipos de desafios para moldar seu espírito. A
meta é alcançar o divino, porque todos podem ser santos e a vida é muito breve.
Vale a pena! Afinal, a vida não finda com a morte, continua num outro plano
espiritual.
--
Diga-me o que devo fazer? – respondeu a moça - Agradeço a Deus por essa minha
vida, mas Ele deve esperar que eu tenha um objetivo mais condizente com o que
Ele espera de mim. Ele me deu tantas condições materiais boas, e, portanto, tenho
tempo para dedicar-me aos outros. Sou muito instruída e prendada, você sabe,
devo empregar esses talentos para uma vida mais pratica, porque para mim só
servem de verniz, para ser elogiada por todos e provocar o aumento do meu ego.
A
serviçal a abraçou com ternura, pois a conhecia desde pequena e sorrindo
disse-lhe:
-- Quando
você der amor, o amor virá ao seu encontro. Não espere mais, procure onde seu
coração se contentará, pois “é dando que se recebe”. Deus lhe deu talentos para
serem usados, da forma como preferir.
Essas
palavras nortearam sua vida, e ela foi se sentindo útil.
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