Elda Nympha Cobra Silveira Cadeira n° 21 - Patrono: José Ferraz de Almeida Junior |
Um portão foi colocado como se
fosse um vigia na entrada de uma mansão, num bairro residencial paulistano bem
no centro da cidade. Era todo de ferro fundido com arabescos, onde se destacava
em dourado o monograma do proprietário. O portão tinha muito orgulho do seu
trabalho. Através dele podia-se ver um lindo jardim cheio de primaveras,
prímulas, agapantos, alamandas, derramadas nos caramanchões e passeios
circundados de amores-perfeitos.
Quando os donos, Carlota e
Adriano se casaram, o portão se escancarou totalmente para dar passagem ao
carro dos noivos apaixonados. Aquela mansão transbordava de felicidade, ainda
mais quando nasceram os filhos Mauro e Gaby. Os pássaros no jardim cantavam
mancomunados com aquele idílio, os arbustos e flores se abriam alegremente
quando alguém passava, porque naquele lugar havia uma aura de felicidade.
O portão não tinha sossego, pois
era um tal de abrir e fechar constante para os dois jovens e seus amigos, que chegavam para nadar
na linda piscina, jogar xadrez ou festejar seus
aniversários. Mas eis que num dia funesto o portão teve que se abrir
para dar passagem a um carro fúnebre, pois Adriano, acometido por um infarto
fulminante, apareceu morto na beira da piscina. Ninguém mais naquela mansão
entrou ou saiu sorrindo como tantas vezes ele chegou a ver. Passavam taciturnos
e Carlota quase nem saía mais, só ficava sentada num balanço, perdida em suas
recordações do amor constante do casal. De como viviam um para o outro, se
compreendiam apenas pelo olhar, prescindindo de palavras.
Mas a tristeza dominou a tudo e a todos,
pairando no ar e empanando a paisagem. As heras começaram a dominar as paredes
externas da casa, entravam por todas as frestas, como que procurando a família dentro da casa,
pois elas não eram mais cuidadas. Até o portão já rangia, como num lamento e
não havia mais possibilidade de ter empregados pela crise financeira que se abateu
sobre aquela família. Os filhos foram estudar na Europa e por lá ficaram
deixando sua mãe triste e solitária.
Os anos se passaram e Carlota se
despede da vida e um outro carro fúnebre passa pelo portão levando sua patroa
para sempre. Dos muitos amigos que tinham, poucos vieram se despedir dela. A
mansão foi vendida pelos filhos, antes que ela se depreciasse ainda mais. O
portão agora era obrigado a se abrir para pessoas que só entravam para
negociar, pensando apenas em dinheiro, a
mansão se transformou num Banco Europeu.
O portão foi pintado, reformado e
mudado o monograma com o nome do Banco e lá dentro tudo se transformou, tudo moderno
e bonito, mas frio, impessoal, sem espiritualidade, sem flores, sem gritos de
crianças, sem animais latindo, gatinhos subindo em árvore e amigos rindo e
festejando. Só útil, sim... apenas útil. Assim o portão deve ter pensado: Vou continuar
me abrindo e me fechando, mas até quando?
Vários anos se passaram e o Banco
Europeu começou a passar por problemas que não se esperava, a guerra embora
fosse fora do Brasil abalou as estruturas econômicas e comerciais e não havia
lastro para honrar compromissos com os clientes do Banco. Antes que precisasse
fechar, Mauro, filho de Adriano e Carlota, gerente do Banco na Europa é designado
como Presidente do Banco Europeu no Brasil.
Mauro, ao chegar, se lembrou de
todo seu passado naquela mansão e agarrando com mãos fortes o portão falou:- “O
bom filho à casa torna.”
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