Piracicaba (Vila da Constituição), que Prudente José de Moraes Barros escolheu para advogar, construir a carreira política e a vida familiar, no início da década dos anos sessenta, ainda ostentava vestígios coloniais e costumes arcaicos. Nas bicas ajuntavam-se os excluídos da sociedade de ordens: mulatas quituteiras, negras picando fumo, moleques de ganho, escravos aguadeiros, caboclas la¬vadeiras, homens a jornal.
As áreas públicas mais conhecidas ficavam no Pátio da Forca, transformado em Largo de Santa Cruz; no Pátio de Santo Antônio, centro da cidade; no Largo da Matriz, repleto de animais pastando; no Largo de São Benedito, ponto de concentração de escravos e onde eram montados os circos. A atividade econômica aparecia nas casinhas (o primeiro mercado, junto ao Teatro) e nas vendas de secos e molhados, armarinhos, botequins, situados na rua de Santo Antônio (Comércio, depois Governador), na rua Direita ou do Picadão de Mato Grosso ou do Sem Fim (Moraes Barros). O casa¬rio barroco aparecia nas ruas da Quitanda (XV de Novembro), dos Ourives (Rangel Pestana), da Glória (Benjamin Constant), de Santo Antônio, da Boa Vista (Alferes José Caetano) e das Flores (13 de Maio). Quebrando a monotonia da Vila, apenas o vaivém das tropas, dos carros de bois e dos cavaleiros.
Na década dos anos setenta, Piracicaba ampliava os seus es¬paços socioculturais, adequando-se aos tempos e ao adensamento demográfico. A economia baseava-se no café e na cana, nos engenhos e nos alambiques, nos gêneros alimentícios e na pecuária. As ruas da Praia (ou do Porto) e do Sabão (Cap. Antônio Corrêa Barbosa), permaneciam ligadas às atividades do rio e do sertão, dotadas 106 Revista da Academia Piracicabana de Letras
de rica comunidade folclórica. O progresso se materializava na te¬celagem Santa Francisca, de Luiz Vicente de Souza Queiroz (1874), no Gabinete de Leitura (1876), na Ferrovia Ytuana (1877), no Colégio Piracicabano (1881), na Gazeta de Piracicaba (1882), no Serviço D’Água (1887), na Praça do Mercado (1888), conquanto rondassem as febres, as bexigas e a lepra. Os espaços políticos partilhavam-se pelas grandes famílias do Oeste, os Souza Queiroz, os Moraes Bar¬ros, os Arruda Botelho e os Ferraz. Em 1885, a população do município era de 22.150 habitantes. Em 1887, contava na área urbana com 7.000 habitantes e 1.600 casas de morada, havendo 5.000 escra¬vos matriculados na Coletoria.
Nas duas últimas décadas da Monarquia, Piracicaba agitara-se pela competição das elites, monarquistas e republicanos - estes construindo um novo poder no Oeste Paulista - e pela tensão gera¬da em torno da organização do mercado livre de trabalho, havendo por chegar ao 13 de Maio com significativa reserva de mão-de-obra escrava. A República veio em complemento às transformações estruturais. Foi durante a primeira década republicana que Piracicaba adquiriu grande prestígio no Oeste Paulista, em virtude do seu progresso e da grande presença da Educação ministrada nas escolas públicas e confessionais. O café e a cana continuavam as suas principais riquezas, além da tecelagem Arethusina e dos dois Engenhos Centrais, das oficinas, das fábricas de produtos alimentícios e de bebidas, do comércio, da iluminação por energia elétrica (1893).
Em 1890, a cidade possuía 2.252 edifícios e 14.000 habitantes urbanos, assistindo à virada do século convulsionada pela construção da rede de esgotos de que dependia o saneamento. Em 1900, ti-nha a oferecer a primeira turma de professores formados pela Escola Normal e no ano seguinte (2° semestre de 1901), a primeira turma de alunos da Escola Agrícola Prática “Luiz de Queiroz”. Não obstante, ressentia-se do isolamento no Oeste Paulista, ao qual tinha acesso pela Ferrovia Ytuana.
A planta de 1901 apontava os rumos da urbanização futura. A Leste, seguia os contornos do Itapeva e da ferrovia, detendo-se nos bairros Alto e dos Alemães, junto às chácaras, entre a rua de Santa Cruz e a Fazenda São João da Montanha. A Oeste, chegava ao bairro da Boa Morte, sucedendo-se as chácaras Nazaré e Morato, as estradas que conduziam a Tietê, bairro do Enxofre e Ferrovia Ytuana, que liga a Itu, Jundiaí e São Paulo. A Sul, parava no Parque dos cemitérios (católico e protestante), no Hospital de Lázaros e no reservatório de água. A Norte e Nordeste, atingia o rio Piracicaba, no bairro do Porto, e o atravessava, junto às terras do Barão de Rezende, em seu loteamento; buscava a estrada do Areão, hoje avenida Rui Barbosa, nascente o bairro de Vila Rezende, de onde partiam três estradas, a de Rio Claro e Limeira, a do Meio e a de São Pedro. Oferecia um perímetro urbano contornável, a pé, compreendendo-se porque os habitantes conheciam-se pelos nomes próprios e apelidos.
Piracicaba adentrou o século XX como cidade paisagística e romântica, dadas as suas belezas naturais, culta e civilizada, em razão da sua escolaridade e saneamento, fazendo jus às observações dos viajantes mais ilustres. Conserva até hoje o pitoresco do seu visual ribeirinho, das praças arborizadas e a hospitalidade das antigas cidades paulistas.
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