Evaldo Vicente Cadeira n° 23 - Patrono: Leo Vaz |
A morte da
diretora do Jornal de Piracicaba, Antonietta Rosalina da Cunha Losso Pedroso,
impõe-me, num momento de profunda emoção, uma rápida análise do que foi o seu
trabalho em defesa e para incentivo dos jornais impressos no Interior do
Brasil. Fomos, desde 1980/82, companheiros de ideais na Associação de Jornais
do Interior do Estado de São Paulo (Adjori-SP) e no Sindicato das Empresas
Proprietárias de Jornais do Estado de São Paulo (Sindjori-SP), entidades que
reúnem a maioria absoluta dos diários, bi, tri e semanários, assim como
quinzenários e mensários que circulam nos mais de 600 municípios paulistas. Foi
secretária, tesoureira e presidente de ambas e deixou um legado que, hoje, as
empresas jornalísticas do Interior reconhecem como realidade.
Seu trabalho como advogada, visão de uma jurista formada nas Arcadas
(Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo –
USP), somando-se à experiência de filha, sobrinha e mãe de donos de
jornal, traçou para os jornais locais caminhos que servem como bússola de
tantos idealistas que sonham com a construção de uma sociedade cada vez mais
justa e humana. Dizia a então presidente Antonietta Rosalina, no discurso de
posse, que os jornais do Interior assustam governos porque eles
"pulverizam" as ideias, mostram caminhos diferentes e não ficam
somente nas mãos de poucos "tubarões" que tentam agrupar seus
interesses e se esquecem dos interesses dos leitores, do público como um todo.
Jornal local é o que mantém o contato direto com o leitor, que vive os
problemas e as glórias do cidadão e enriquecem a comunidade quando aplaudem ou
quando cobram das autoridades locais decisões em favor da sociedade.
Isso fizemos – muitas vezes, eu como secretário e depois presidente da
Adjori-SP – como verdadeiros pregadores, ocupando espaços pequenos, mas que
recebiam essa mensagem da importância e necessidade do veículo local de comunicação
impresso. Fomos de Ilha Solteira a Taquarivaí, do Guarujá a Votuporanga, de
Ubatuba a Valparaíso, cruzamos o Estado de São Paulo (e outros Estados também)
nessa prédica, exatamente na virada das décadas de 80 para 90, quando os
jornais, especialmente os que possuíam oficina impressora, mudavam
definitivamente do processo quente para o frio, isto é, deixando as linotipos
com chumbo e impressão plana, para a composição fria (offset) com impressão
rotativa. Foi uma mudança extrema, da noite para o dia, em que as empresas
jornalísticas derreteram o passado, mandaram-no para as caldeiras e investiram
tudo de novo, como ocorreu com os jornais das capitais também. Mas o nosso
foco, de Antonietta Rosalina e meu, representando as entidades, era o jornal
local.
É que o jornal local "pulveriza", repito. Em seu discurso de
posse, em Águas de Lindoia, na presidência da Adjori-SP, e depois na despedida
em Serra Negra, ou ainda na posse como presidente do Sindjori-SP, Antonietta
foi de uma perseverança extrema, de uma dedicação total, até de uma ousadia, ao
afirmar que seria impossível aos governos qualquer controle de tantos e tantos
"grandes jornais pequenos", apesar de existirem, também,
"grandes jornais grandes". Ela me alegrava nos elogios que me fazia
porque eu desejava repetir as explicações sobre a colocação correta dos
adjetivos qualificativos. Seu verbo "pulverizar" calou-me, cala-me
até hoje, e cala em todos os que fazem jornal local com a independência
necessária na defesa do leitor-cidadão.
Foi Antonietta que, por bondade aos meus esforços como jornalista e
dono de jornal, me indicou para representar o Brasil na Argentina e, de lá,
trazer o Projeto Jornal na Escola. Foi minha primeira viagem internacional, em
1989, sempre no sonho de fazer um jornal local do melhor possível. Era
estimular o ensino com uso do jornal em sala de aula, hoje uma realidade
para inúmeros jornais, grandes ou pequenos. Ela sentia os ideais do
amigo, que não era e não é um concorrente, mas um fiel defensor do veículo impresso
que fica perto do cidadão, aquele que é cobrado no dia-a-dia da comunidade, e
responde à altura para que a empresa tenha o faturamento necessário para a
sobrevivência. É, sim, o que "pulveriza" as ideias e não permite a
centralização de interesses. É, sim, o que espalha, pois são muitos e muitos
são os jornais que podem aparecer como respiro da democracia. Outros veículos,
como rádio e televisão, não; estes são concessão estatal.
Num dos maiores encontros de jornais que realizamos, em Votuporanga,
ao discursar, usei uma expressão – ensinada pelo clássico Antonio Vieira – de
que "o Evangelho deve ser espalhado na Terra como Deus espalhou as
estrelas no céu", para afirmar que os "jornais impressos devem ser
espalhados na terra, como as estrelas foram espalhadas no céu", e
a amiga e incentivadora Antonietta Rosalina veio me cumprimentar,
abraçando-me para dizer, segundo ela, da "beleza da comparação", de
que eu tinha sido feliz para que o secretário de Comunicação do Estado, Eurico
Andrade (governo Fleury Filho), pudesse ouvir e entender.
O bom amigo Eurico entendeu, sim. Mas eu quis dizer, naquele momento,
como digo agora com saudade, que é preciso "pulverizar", sim,
Antonietta.
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